Cobrança de ICMS sobre tarifas na geração distribuída de energia pode ser questionada a partir de jurisprudência do STJ

Cobrança de ICMS sobre tarifas na geração distribuída de energia pode ser questionada a partir de jurisprudência do STJ

Em 2017, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) realizou um julgamento a respeito da legalidade da inclusão das Tarifas de Uso dos Sistemas de Transmissão (TUST) e Distribuição (TUSD) de energia elétrica, na base de cálculo do ICMS. Com essa medida, houve a suspensão dos processos judiciais em andamento sobre o tema em todo o território nacional. A decisão do STJ é de repercussão geral. Ela deverá ser seguida pelos juízes de primeira instância e Tribunais de Justiça, garantindo segurança jurídica e igualdade.

Cobrança de ICMS sobre tarifas na geração distribuída de energia pode ser questionada a partir de jurisprudência do STJ

Até então, embora existissem poucas decisões contrárias ao interesse dos contribuintes, a Corte possuía “entendimento consolidado” de que as tarifas não deveriam integrar a base de cálculo do ICMS sobre o consumo de energia elétrica. O argumento era que, por serem cobradas na fase anterior ao consumo, não poderiam compor o valor da operação de circulação da mercadoria sujeita ao imposto.

Os consumidores de energia elétrica aguardam a decisão final do STJ sobre o tema. Enquanto isso, nova polêmica acerca da cobrança do TUST e TUSD foi trazida para debate. A discussão hoje trata da incidência do ICMS sobre estas tarifas na hipótese de geração distribuída.

De acordo com a Resolução ANEEL nº 482/2012, a geração distribuída de energia elétrica pressupõe um sistema de compensação. Há um empréstimo gratuito dessa mercadoria pelo consumidor à distribuidora local, com posterior compensação com o consumo de energia elétrica ativa. Portanto, não se pode falar em venda de energia pela concessionária, exceto com relação à quantidade excedente àquela emprestada pelo consumidor.

Com o aumento da tarifa de energia elétrica e maior acessibilidade aos equipamentos de geração solar, muitos consumidores passaram a gerar sua própria energia. Isso acarretou a necessidade de maior clareza para a regulamentação do setor. Nesse contexto, foi editada em janeiro a Lei nº 14.300/2022. Ela institui o marco legal da microgeração e minigeração distribuída, o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) e o Programa de Energia Renovável Social (PERS).

De acordo com a nova lei, as unidades consumidoras deverão ser faturadas pela incidência sobre a energia elétrica ativa consumida da rede de distribuição. E também sobre o uso ou sobre a demanda, de todas as componentes tarifárias não associadas ao custo da energia. Porém, as micro e minigeradoras já existentes passarão a pagar a TUSD somente a partir de 2045. Ela será calculado sobre a diferença positiva entre o valor da energia consumida e o valor da energia gerada e injetada na rede de distribuição. Já os consumidores que aderirem ao sistema de geração distribuída, instalando projetos a partir de fevereiro de 2023, passarão a receber uma cobrança da TUSD. Ela será relativa aos ativos do serviço de distribuição, depreciação dos equipamentos da rede e do custo da operação e manutenção do serviço prestado pela concessionária.

Se considerarmos que a minigeração e microgeração distribuída pressupõem um empréstimo de energia elétrica pelo consumidor final, em princípio seria possível concluir que a cobrança da TUSD e de quaisquer outras componentes tarifárias não associadas ao custo da energia seriam irrelevantes para fins de composição da base de cálculo do ICMS. Isso porque esse imposto incide apenas sobre operações comerciais, o que não ocorre nesse caso.

Porém, de acordo com o Convênio ICMS 16/2015, as Unidades da Federação foram autorizadas a conceder isenção de ICMS incidente sobre a energia elétrica fornecida pela distribuidora à unidade consumidora, na quantidade correspondente à soma da energia elétrica injetada na rede de distribuição pela mesma unidade consumidora. Tudo feito nos termos do SCEE, estabelecido originalmente pela Resolução ANEEL nº 482/2012.

Segundo determinado na cláusula primeira deste Convênio, a isenção do ICMS “não se aplica ao custo de disponibilidade, à energia reativa, à demanda de potência, aos encargos de conexão ou uso do sistema de distribuição, e a quaisquer outros valores cobrados pela distribuidora”. Significa, portanto, que as Unidades da Federação pretendem exigir o ICMS sobre a TUSD e outros encargos pagos pelos consumidores na microgeração e minigeração distribuída.

Essa pretensão das Unidades da Federação é um indicativo de que não apenas os consumidores  que adquirem energia da distribuidora, mas também aqueles que aderiram à microgeração e minigeração distribuída devem atentar para a decisão a ser proferida pelo STJ. Principalmente, acerca da inclusão das tarifas como TUST e TUSD na base de cálculo do ICMS. O entendimento da Corte acerca deste tema será aplicável tanto aos consumidores comuns quanto àqueles que possuem geração própria.

Contudo, a geração distribuída disciplinada na Lei nº 14.300/2022. Ela obriga as concessionárias de distribuição de energia a oferecerem aos geradores a conexão a sua rede. E são remuneradas por isso. Sendo assim, não haveria que se falar em compra e venda de energia elétrica, fato gerador do ICMS. O posicionamento defendido pelos Fiscos Estaduais é no sentido de que a TUST e TUSD deveriam ser incluídas na base de cálculo do ICMS. O argumento é que ajudam a compor o custo da energia elétrica fornecida. Mas, se esse produto não estiver sujeito à incidência do imposto por inexistir operação comercial, as referidas tarifas também não poderiam estar.

Em síntese, apesar das Unidades da Federação pretenderem exigir o ICMS sobre a TUST e TUSD, fato é que a decisão a ser proferida em breve pelo STJ produzirá efeitos também aos autogeradores na microgeração e minigeração distribuída. Nessa hipótese, há ainda mais razão para o imposto não ser cobrado sobre essas tarifas. Uma vez que não se verifica compra e venda, mas empréstimo de energia elétrica que é devolvida ao consumidor pela concessionária.

Artigo de Carolina Romanini Miguel, sócia da área tributária do Cescon Barrieu Advogados
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