A eletrificação dos veículos pesados – caminhões e ônibus – já é uma realidade em países como China, Estados Unidos e algumas nações da Europa. No Brasil, o movimento começa a ganhar fôlego, mas ainda enfrenta desafios técnicos, regulatórios e de infraestrutura.
Segundo dados da Plataforma E-Bus Radar, até junho de 2025, o Brasil contava com 1.143 ônibus elétricos em operação, sendo 794 convencionais a bateria, 327 trólebus e 21 articulados. Balanço da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) aponta que no primeiro semestre de 2025, em todo o país, entraram em linha 306 ônibus elétricos, um crescimento expressivo. Os números são relevantes, mas ainda modestos diante do tamanho da frota nacional.
De acordo com o terceiro anuário Anuário Brasileiro da Mobilidade Elétrica, no mercado de caminhões, a penetração é ainda mais incipiente – seguindo a tendência global, em que a participação de elétricos médios e pesados permanece abaixo de 1% fora da China.
Avanços e desafios da infraestrutura
Carlos Gabriel Bianchin, pesquisador do Lactec e coordenador da Unidade Embrapii de Inteligência Embarcada, aponta que o principal entrave para expansão da frota elétrica pesada é a infraestrutura de carregamento. “O maior desafio é compor a demanda de potência que o veículo elétrico pesado exige com o modelo de negócio apropriado, sem causar prejuízos ou investimentos que demorem a retornar para operadores e frotistas”, explica.
As estações de carregamento de alta potência exigem investimentos robustos e podem pressionar a rede elétrica. Para mitigar o impacto, Bianchin destaca o uso de sistemas de armazenamento de energia, capazes de equilibrar a demanda entre rede e baterias auxiliares, reduzindo custos e aumentando a estabilidade.
Outro desafio é a localização dos eletropostos. “Isso depende da região, da frota, da disponibilidade de energia elétrica e da aplicação de transporte. Cada caso precisa de um modelo de negócio customizado”, afirma o pesquisador.
Oportunidades para o setor
Apesar dos obstáculos, o mercado apresenta oportunidades. Para os operadores de frotas, os veículos elétricos oferecem: redução de custos de manutenção, já que motores elétricos têm menos peças móveis; eliminação da necessidade de estoque de combustível; menor poluição sonora, com impacto positivo em áreas urbanas; ganhos de imagem e adequação a metas de descarbonização. Além disso, distribuidoras de energia têm papel central nesse ecossistema. Elas não apenas fornecem eletricidade, mas também podem investir em projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para novas soluções de carregamento.
Pesquisa e tecnologia nacionais
O Brasil já conta com centros de pesquisa dedicados a desenvolver carregadores mais eficientes e adaptados à realidade da rede elétrica nacional. O Lactec, um dos maiores centros de pesquisa, tecnologia e inovação do Brasil, por exemplo, atua em projetos para reduzir custos e aumentar a viabilidade de soluções voltadas ao transporte pesado elétrico. Entre as tecnologias que despontam mundo afora, estão os sistemas de carregamento sem fio, ainda em desenvolvimento e aplicados em testes pilotos. Mas, segundo Bianchin, o carregamento rápido em corrente contínua (DC) ainda é a solução mais viável para ônibus e caminhões.
Mercado global em movimento
O cenário internacional mostra a velocidade da transição. Só em 2022, a China vendeu 54 mil novos ônibus elétricos e 52 mil caminhões pesados elétricos, o que representou 80% a 85% das vendas globais (dados do terceiro anuário Anuário Brasileiro da Mobilidade Elétrica).
Na América do Sul, Santiago (Chile) e Bogotá (Colômbia) já despontam como líderes regionais. Até agosto de 2025, as cidades tinham mais de 7 mil ônibus elétricos em circulação (dados da Plataforma E-Bus Radar). No Brasil, pelo menos nove fabricantes atuam na produção de ônibus elétricos. O mercado brasileiro já conta com 25 modelos disponíveis, prontos para atender às demandas específicas dos municípios.
E o Brasil, está pronto?
A resposta, por enquanto, é: a transição começou, mas ainda falta estrada pela frente. O país conta com incentivos governamentais e uma malha de pesquisa tecnológica em expansão. Contudo, a infraestrutura de carregamento, a adaptação da rede elétrica e a escala de produção de veículos ainda precisam amadurecer.
“O Brasil tem condições técnicas e científicas de avançar, mas será fundamental alinhar modelos de negócio sustentáveis para que os investimentos em infraestrutura tragam retorno rápido e estimulem a adesão dos frotistas”, conclui Bianchin.





