Mercado livre de gás natural um caminho sem volta para a indústria brasileira

Mercado livre de gás natural: um caminho sem volta para a indústria brasileira

O mercado livre de gás natural é, hoje, uma das principais alavancas de transformação da matriz energética industrial no Brasil. Desde a aprovação da Nova Lei do Gás, em 2021, o país vem dando passos importantes rumo à liberalização do setor, de modo a promover assim a desconcentração da oferta, o estímulo à concorrência e a construção de uma infraestrutura mais moderna e conectada com os desafios da descarbonização.

O novo arcabouço regulatório representa mais do que uma simples abertura de mercado — é uma estrutura que traz mudança cultural. Ao conceder ao consumidor o poder de escolha, o modelo transfere o protagonismo para a indústria, que passa dessa forma a gerir os seus riscos e decidir como, de quem e em que condições contratar sua energia. E essa liberdade não é apenas comercial: gera impactos profundos na eficiência operacional, na previsibilidade de custos e na capacidade de adaptação ao cenário global.

A migração para o ambiente livre de gás natural já apresenta resultados concretos em estados com regulação madura e infraestrutura consolidada, como São Paulo. Neste estado, grandes consumidores industriais têm conseguido renegociar contratos, acessar moléculas de gás natural em condições mais competitivas e montar portfólios diversificados com flexibilidade contratual. Isso permite, por exemplo, equilibrar contratos de curto e longo prazo, reduzir penalidades logísticas, planejar com mais precisão os volumes sazonais e, sobretudo, obter oportunidades de mercado balanceando competitividade e riscos.

Em paralelo, o modelo estimula a profissionalização da gestão energética. A figura do comercializador se fortalece, o que traz inteligência analítica, suporte técnico e estratégias de contratação sob medida. Essa sofisticação é essencial para garantir que o ganho financeiro não reflita em insegurança de abastecimento — um ponto crítico para as operações industriais intensivas em energia.

Os impactos também são ambientais: embora o gás natural ainda seja uma fonte fóssil, seu uso representa um avanço importante frente aos combustíveis mais emissores, como os do processo industrial que podem se tornar produtos vendáveis – a depender desta competitividade ou mesmo do óleo combustível. Além disso, o mercado livre abre espaço para o crescimento de soluções complementares, como o biometano e contratos de fornecimento híbridos, que combinem eficiência econômica com metas ambientais claras.

Neste cenário, algumas companhias vêm se posicionando como referência. Um exemplo é a migração do parque industrial da Braskem no estado de São Paulo, concluída em 2025, com suporte da VOQEN, sua comercializadora de energia e gás natural. O modelo, construído com base em inteligência de portfólio e visão de longo prazo, gerou uma economia significativa nos custos de aquisição de gás e demonstra portanto o potencial do mercado livre para reestruturar o papel da energia nas estratégias industriais.

Apesar do avanço, ainda há desafios a serem enfrentados. A regulação estadual permanece desigual entre os estados. Enquanto alguns contam com regras claras e operacionais, outros ainda estão em fase de discussão ou implementação. A construção de uma malha de transporte mais capilar e a harmonização regulatória entre estados e União serão fundamentais para garantir que os benefícios do mercado livre cheguem a todos os setores da economia. Além disso, existe uma relevante falta de competitividade no escoamento, no transporte e na distribuição, quando comparamos a competitividade deste energético ofertado no Brasil com outros países.

A boa notícia é que o movimento parece irreversível. Governos, empresas, reguladores e consumidores estão percebendo que a liberdade de contratação não é apenas um diferencial, mas uma condição necessária para modernizar a base produtiva do país, atrair investimentos e garantir competitividade global.

O mercado livre de gás natural não é uma tendência passageira. É uma peça central de um novo modelo energético e industrial para o Brasil. Um modelo cuja eficiência, sustentabilidade e autonomia caminham juntas — e onde o papel da energia deixa de ser um custo fixo para se tornar vantagem estratégica.

Artigo de Gustavo Checcucc, diretor de Energia e Descarbonização Industrial da Braskem
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